
Os direitos dos indígenas e a PEC 215 centralizam discussões na Oca da Sabedoria
Desde o ano 2000 a Proposta de Emenda Constitucional 215, que transfere o poder de demarcação de terras indígenas e quilombolas, do Governo Federal para o Congresso Nacional, tenta entrar na pauta do Congresso. Em 2013, ela foi admitida, e na última terça-feira, 27 de outubro, foi aprovada em Comissão Especial. Até sua aprovação final há um longo caminho, mas essas questões centralizaram o debate sobre Direitos Humanos e Direitos dos Indígenas no Fórum Social Indígena que acontece todas as manhãs na Oca da Sabedoria durante os Jogos Mundiais dos Povos Indígenas (JMPI).
Nesta quinta-feira, 29, o antropólogo, assessor
para povos e comunidades tradicionais da Secretaria Especial dos Direitos
Humanos- do Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e Direitos Humanos,
Thiago Garcia, fez um histórico das conquistas de direitos dos Povos
Indígenas, registrados principalmente na Constituição Federal de 1988, e
fruto da mobilização de lideranças como os irmãos Marcos e Carlos Terena, do
Caiapó Paulinho Payakan, dentre outros.
“Foi a organização dos povos
indígenas que conseguiu uma presença muito forte na Constituinte de 88,
que mudou linhas de pensamento sobre as políticas indígenas, como o paradigma
da Integração, de que estes seriam integrados naturalmente a cultura do não
índio”, explicou.
Além da Constituição Federal, a
resolução 69 da Organização das Nações Unidas, ratificada em 2004 no Brasil, é
um importante instrumento de garantias de direitos dos Povos Indígenas, dentre
eles estão principalmente o da autodeterminação, que garante a participação
social e consulta livre prévia sobre temas de seus interesses; o da
territorialidade; o da gestão ambiental; os direitos coletivos e individuais,
como saúde e previdência social; e o direito a memória e a verdade. A autodeteminação,
ou seja, o poder dos indígenas de determinarem como querem seguir suas vidas,
gerir seus territórios, é considerado conquista fundamental para a
autonomia destes Povos.
Todas estas conquistas, algumas mais
consolidadas que outras, são de alguma forma ameaçadas pela PEC 2015, na
observação de Thiago Garcia, uma vez que ao tirar do Governo Federal o poder de
demarcação dos territórios, migra-se de critérios técnicos para critérios
políticos,que podem afetar diretamente toda a autonomia e forma de organização
dos povos indígenas.
“Estamos em um momento complexo de aprofundamento
de radicalismo, de crise democrática, que também se reflete na questão
indígena, onde há tentativas fortes de retrocesso em relação aos direitos
indígenas, como a PEC 215”, explica o antropólogo ao dizer que a Proposta fere
princípios constitucionais e de direitos humanos. “Se a PEC 215 for aprovada,
ela vai transformar as questões técnicas em questões políticas. O Governo
Federal é contra a PEC, pois ela é um equívoco, em forma e conteúdo, modificando
inclusive direitos fundamentais, que não são modificáveis”, ressaltou ao dizer
que o momento é de mobilização para que a Emenda não avance no Congresso
Nacional.
Já um dos articuladores dos I JMPI,
Marcos Terena, afirmou que os Povos Indígenas estão acompanhando a PEC 215 com
bastante preocupação, pois ela revoga um direito que pensavam já está
conquistado na Constituição de 88. “A gente lutou lá em 88, e mesmo sem um
deputado indígena conseguimos um capítulo inteiro dos nossos direitos, e pensamos
que estava tudo bem, conseguimos nesse período fazer muitas demarcações de
terras. Agora vem um Congresso conservador e quer tirar esses
direitos”.
Terena também criticou a forma em que
foi realizada manifestação contra a PEC na noite de quarta-feira, 28, na Arena
Verde, e disse que é preciso que haja uma mobilização, mas que não prejudique
os Jogos e desrespeite os demais Povos.
Como proposta de ação inicial Terena
apresentou uma moção de repúdio, a ser assinada pelos Povos presentes nos I
JMPI e encaminhada ao Congresso Nacional.